Não, Jung não faz parte da Psicanálise.

Volta e meia alguém me pergunta:

– Lucas, por que vocês não estudam Jung na Confraria Analítica?

(Para quem não sabe, a Confraria é minha escola de formação teórica em Psicanálise.)

Eu sempre respondo que o motivo é simples: Jung não faz parte do campo psicanalítico.

Provavelmente, a pessoa que fez a pergunta recebe esta resposta com estranheza porque há muitos supostos psicanalistas por aí dizendo que ensinam Jung.

Gente, vamos deixar uma coisa bem clara:

Há muitos aventureiros se apropriando indevidamente da palavra “Psicanálise” porque ela goza de muito prestígio aqui no Brasil.

As críticas toscas do pessoal da PBE (Prática Baseada em Evidências) não fazem nem cosquinha nesse imenso prestígio.

Então, alguns desses falsos psicanalistas inventaram a fake news de que as ideias de Jung fazem parte da Psicanálise.

Não fazem.

Jung se afastou do movimento psicanalítico por volta de 1912, quando publicou o fatídico livro “Metamorfoses e Símbolos da Libido”.

A partir dessa obra, ele começou a defender concepções que representavam um verdadeiro retrocesso em relação às descobertas da Psicanálise.

Jung propunha, por exemplo, que a libido seria uma força vital genérica e não uma energia psíquica de natureza especificamente sexual.

Daí pra frente, foi só pra trás:

Ele passou a acreditar que todo ser humano estaria destinado a trilhar uma espécie de jornada espiritual de autodesenvolvimento, o tal “processo de individuação”.

A função da terapia seria ajudar o sujeito a voltar para os trilhos desse processo a fim de alcançar a meta de se tornar um ser inteiro, integrado, completo…

Gente, sério, isso tem alguma coisa a ver com a Psicanálise?

É óbvio que não!

Não há nada mais distante dos objetivos da terapia psicanalítica do que um ideal de completude.

Portanto, não, a Psicologia Analítica de Jung não faz parte do campo psicanalítico.

Mas eu quero demonstrar isso para você de uma forma ainda mais clara.

Por isso, acabei de publicar na Confraria a aula “Por que a abordagem de Jung não faz parte da Psicanálise?”. Ela está no módulo AULAS TEMÁTICAS – TEMAS VARIADOS.

Nessa aula, eu analiso um caso clínico do próprio Jung e mostro como sua proposta terapêutica não é apenas diferente da psicanalítica.

É o exato OPOSTO.

Depois dessa aula, você nunca mais vai confundir Jung com Psicanálise.

Ao se tornar membro da Confraria, você terá acesso não só a ela, mas a mais de 500 horas de conteúdo sobre teoria psicanalítica.

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Deixem o nosso narcisismo em paz!

Originalmente, o termo “narcisismo” foi empregado por psiquiatras do século XIX para nomear uma experiência εróticα atípica.

Nela, o sujeito, ao invés de se relacionar com outras pessoas, buscaria satisfação sεxuαl por meio da contemplação de si mesmo e do toque no próprio corpo.

Em 1914, Freud ressignificou o conceito, dando a ele um sentido metapsicológico:

Narcisismo designaria o investimento de libido (energia psíquica sεxuαl) no próprio Eu, ou seja, um processo normal e, inclusive, prevalente no início da vida.

Trocando em miúdos, em Freud o narcisismo deixou de ser pensado como uma pεrvεrsão e passou a ser concebido como um aspecto estrutural da subjetividade.

O problema é que, com o passar do tempo, o termo foi empurrado de volta para o campo da patologia.

Muitos psicanalistas contribuíram para isso ao falarem de narcisismo em seus textos num tom pejorativo, como se ele fosse uma falha moral.

Façamos essa mea culpa.

Além disso, autores de fora da psicanálise começaram a usar a expressão, também de modo depreciativo, transformando-a, aos poucos, em outra coisa.

Por essa razão, o que se fala hoje em dia, principalmente na internet, sobre “narcisismo” e “narcisistas” nada tem a ver com o que Freud formulou.

Do ponto de vista psicanalítico, narcisismo não é patologia.

Nem pecado.

Um sujeito que ama o próprio Eu não está errado nem doente.

Pelo contrário!

Uma pessoa que direciona pouca libido para si mesma é que está em maus lençóis.

Afinal, se o Eu não é suficientemente bem investido, sobra energia em excesso que será canalizada para outras pessoas.

E isso pode levar o sujeito a ficar excessivamente dependente e submisso aos caprichos de quem ama.

É claro que o EXCESSO de narcisismo também é patológico.

Mas a clínica mostra que esse cenário paradoxalmente aparece como defesa contra uma falta de narcisismo saudável.

Em outras palavras, o sujeito precisa acreditar que é o MÁXIMO porque sua história de vida o levou a se sentir, no fundo, como o MÍNIMO.

Espero que passe logo essa moda de “narcisismo pra cá, narcisista pra lá” e possamos voltar a usar o conceito em paz.


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[Vídeo] A visão revolucionária de Fairbairn

Esta é uma pequena fatia da aula “Fairbairn e sua crítica à visão freudiana da libido” que já está disponível no módulo AULAS TEMÁTICAS – TEMAS VARIADOS da CONFRARIA ANALÍTICA.


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[Vídeo] A sexualidade não se reduz à cama


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[Vídeo] Os sintomas são a atividade sexual dos doentes


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[Vídeo] O que é metapsicologia em Psicanálise?


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[Vídeo] A libido não é infinita

Esse corte foi extraído da nossa última aula AO VIVO de segunda-feira na CONFRARIA ANALÍTICA.

Hoje, a partir das 20h, teremos mais um encontro.

Estamos estudando linha a linha o texto de Freud “Sobre o narcisismo: uma introdução”.

Te vejo lá!


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[Vídeo] Sexualidade na visão da Psicanálise

Esse corte foi extraído da nossa última aula AO VIVO de segunda-feira na CONFRARIA ANALÍTICA. Hoje, a partir das 20h, teremos mais um encontro. Estamos estudando linha a linha o texto de Freud “Sobre o narcisismo: uma introdução”. Te vejo lá!


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O que é libido em Psicanálise?

Você já ouviu médicos ou leigos dizerem que antidepressivos e outros medicamentos podem reduzir a libido?

Então… Essas pessoas NÃO estão se referindo ao conceito psicanalítico de libido. Em Psicanálise, libido não é o mesmo que tesão.

Nesse sentido, do ponto de vista psicanalítico, não existem pessoas com libido alta ou libido baixa. Ela varia, de fato, mas em termos de direção, ou seja, ela pode estar mais orientada para X do que para Y, por exemplo, mas SEMPRE estará voltada para algum lugar…

Deixa eu explicar isso direitinho.

Libido é um termo em latim que pode ser traduzido por “desejo”. Ele foi introduzido na literatura científica lá no fim do século XIX pelos primeiros sexólogos para designar justamente o que a gente chama popularmente de tesão. Por isso, a medicina ainda hoje utiliza essa expressão no sentido de desejo sexual.

Freud, por sua vez, vai pegar esse conceito e dar a ele uma conotação muito mais ampla, assim como fez com a noção de sexualidade que, antes de ele, se referia apenas a práticas relacionadas aos órgãos genitais.

Na obra freudiana, a libido será vista como uma ENERGIA que sustenta a ação da pulsão de vida em nós. Considerando que a pulsão de vida refere-se à tendência inata que temos de buscar manter e expandir a vida, podemos pensar na libido como o combustível que permite a expressão dessa tendência.

Todavia, diferentemente da gasolina ou do álcool, a libido é um combustível que nunca acaba e tampouco diminui. Nosso “tanque” está sempre cheio de libido.

Uai, Lucas, mas e essas pessoas que dizem que estão sem desejo sexual? Elas não estão com falta de libido?

Não. Essa libido que supostamente estaria faltando provavelmente está sendo investida em outra coisa. O tesão é apenas uma das formas de manifestação da pulsão de vida. O autocuidado, o desejo de trabalhar, a devoção religiosa, o ímpeto criativo do artista, enfim, todas essas manifestações que denotam em nós a existência de um amor pela vida também são sustentadas pela energia libidinal.

Quem está na Confraria receberá ainda hoje uma aula especial em que explico a evolução do conceito de libido na obra de Freud e dou mais detalhes a respeito dele.


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[Vídeo] Engordar e emagrecer: considerações psicanalíticas

Entenda a regra da abstinência de Freud (parte 1)

laura-week-two-1920Em 1915, no artigo “Observações sobre o amor transferencial”, Freud escreveu que “o tratamento [psicanalítico] deve ser levado a cabo na abstinência”. O público leigo poderia pensar que Freud estava apenas alertando os analistas para que jamais cedessem à tentação de terem algum envolvimento amoroso e/ou sexual com seus pacientes. O buraco, contudo, é mais embaixo. Para Freud, não se tratava de uma questão meramente ética, mas, sobretudo técnica. A abstinência em questão deveria ser mantida principalmente do lado do paciente.

Neste momento você pode estar se perguntando: “Como assim?”. Para entendermos porque Freud defendeu que o tratamento psicanalítico deve acontecer num estado de abstinência, é preciso levar em conta a forma como Freud entendia o surgimento de uma neurose, ou seja, do tipo de adoecimento psíquico que mais aparecia em sua clínica.

Para Freud, uma neurose, seja ela uma obsessão, uma histeria ou uma fobia, é sempre o resultado de um grave conflito psíquico. Conflito entre aquilo que o sujeito acredita que é (o que Freud chamou de ego) e determinados pensamentos, lembranças e fantasias que num primeiro momento lhe proporcionam muito prazer, mas que ele acaba mandando para o inconsciente porque não estão de acordo com a imagem que tem de si mesmo. Um exemplo bobo: uma moça criada em um contexto religioso muito severo acredita que não deve jamais fazer sexo oral com seu marido, pois isso a desqualificaria como mulher. Quando adolescente, no entanto, essa moça já teve fantasias de que fazia sexo oral em um professor. Como tais pensamentos eram incompatíveis com seu ego, a moça, embora sentisse muito prazer, recalcou-os no inconsciente.

Pois bem, a neurose, de acordo com Freud, poderá emergir justamente quando esses pensamentos que foram recalcados tiverem oportunidade de ser “reativados”. Se isso acontecer, o sujeito precisará se defender a fim de impedir que eles novamente se manifestem. Do contrário, terá de ver manchada a bela imagem que tem de si mesmo. Estabelece-se, então, uma guerra entre o ego e os pensamentos recalcados. Quem costuma vencer? Freud dirá: ambos! Ego e recalcado fazem uma espécie de “acordo”. O ego permite que o recalcado se manifeste desde que seja de forma disfarçada. A neurose é precisamente um desses disfarces! Na histeria, o recalcado se disfarça como sintomas corporais: dores, parestesias, formigamentos, vômitos etc. Na neurose obsessiva, o disfarce é constituído de pensamentos irrelevantes que não saem da cabeça do sujeito. E na fobia, o medo de um objeto, animal ou situação é a máscara adotada pelo recalcado.

E o que a abstinência tem a ver com tudo isso é o que você deve estar se perguntando. Ora, a questão que ficou em aberto acima é a seguinte: como é que os pensamentos, fantasias e lembranças recalcados entram novamente em ação? Freud responde: quando a libido, a energia sexual, retorna para eles. E como a libido retorna para eles? Quando ela não tem mais para onde ir. Não entendeu, né? Eu explico: quando estamos nos relacionando com alguém e nos sentimos satisfeitos com esse relacionamento, grande parte da nossa libido está investida na pessoa com quem estamos nos relacionando. Portanto, o recalcado não tem combustível para “subir” até as portas da consciência. Contudo, se por alguma razão, o relacionamento atual for rompido (seja pela morte da pessoa amada ou por uma separação mesmo) aquela libido que estava investindo o objeto de amor, acaba ficando livre, leve e solta. Como forma de compensar a frustração sofrida, ela vai reinvestir aqueles pensamentos que um dia nos provocaram satisfação. Que pensamentos são esses? Sim, os recalcados, que agora terão munição de sobra para entrarem em combate com ego novamente.

Em outras palavras, a neurose como “acordo” entre o recalcado e o ego só foi possível porque a realidade deixou o indivíduo num estado de… abstinência!

Leia a parte final

Cursos na Área de Estética

Por que muitos adolescentes atravessam uma fase de excessiva timidez em relação ao sexo oposto?

Diferentemente do que insistem em dizer os médicos e psicólogos, de acordo com o saber psicanalítico (que, a propósito, é derivado da clínica), a adolescência não é o primeiro momento de manifestação da sexualidade.

Guerra e paz
Freud demonstrou que a sexualidade já se faz presente desde o nascimento e, sobretudo, nos primeiros cinco anos de vida se apresenta de modo bastante intenso. Nesse primeiro momento de irrupção da pulsão sexual, a libido circula predominantemente por zonas do corpo que estão mais diretamente ligadas às necessidades básicas do indivíduo, a saber: a boca e o ânus. É só na puberdade que os órgãos genitais irão adquirir proeminência como zonas de excitação sexual e, ainda assim, por uma necessária intervenção da cultura.

Nesse sentido, o período da adolescência testemunha um segundo movimento de expressão aguda da pulsão sexual. Entre mais ou menos os cinco ou seis anos de idade e a puberdade (por volta dos dez ou onze anos) estabelece-se um período que Freud chamou de “latência”, pois durante essa faixa de tempo a pulsão sexual estaria num período de relativa calmaria, permitindo ao sujeito internalizar de modo tranqüilo os ensinamentos morais e educacionais que lhe são impostas pelos pais e pela sociedade. Na adolescência, esse período de “trégua” da pulsão sexual é abruptamente desfeito e a sexualidade retoma suas armas com uma força tão grande que chega a assustar o jovem que, em função do período de latência, esquecera-se de que em seu corpo habitava tamanha volúpia.

“Por isso essa força estranha…”

Esse retorno súbito da pulsão sexual, sem aviso prévio, é um dos motivos que leva o adolescente a se sentir inadequado, desconfortável, envergonhado e, por conta disso, a refugiar-se, muitas vezes, numa atitude de isolamento e timidez. Ao ser tomado de assalto por aquela estranha força que curiosamente advém de si mesmo e que traz consigo uma série de alterações no corpo (pêlos, menstruação, crescimento dos seios etc.) o adolescente se sente como se estivesse o tempo todo nu. Isso ocorre porque a pulsão se manifesta de modo tão intenso que começa a parecer ameaçadora, de modo que a imagem egóica que o sujeito havia constituído até então para si torna-se frágil. A sensação de nudez perene é uma das formas possíveis de elaboração pela via da fantasia da da insegurança gerada por tais alterações subjetivas.

Fantasmas de amor

No entanto, um número grande de adolescentes experimenta um retraimento muito mais severo em relação ao sexo oposto e isso está ligado não tanto à segunda irrupção ameaçadora da pulsão sexual, mas à primeira. Explico: no advento da pulsão sexual na infância, dissemos que a libido está bastante fixada na boca e no ânus, que são zonas do corpo ligadas à satisfação de necessidades fisiológicas do indivíduo.

No entanto, para que o pequeno infante pudesse se satisfazer sexualmente a partir dessas zonas, outras pessoas tiveram que se fazer presentes na vida do bebê. Que pessoas são essas? A mãe, o pai e/ou outros que estivessem cuidando do bebê na época. Uma dessas outras pessoas forneceu o seio ou algum substituto para a satisfação da necessidade de alimentação e, ao mesmo tempo, estimulou a mucosa da boca do bebê fazendo com que ele obtivesse um prazer a mais, um prazer que não era o da saciedade por ter sido alimentado, mas um prazer ligado propriamente à estimulação da mucosa da boca, um prazer, portanto, sexual. Embora esse prazer fosse essencialmente autoerótico, ele passou a estar irremediavelmente ligado à pessoa que forneceu o objeto para que ele fosse sentido. Lembrando que essa pessoa geralmente é a mãe. O mesmo ocorre com o prazer ligado à satisfação da necessidade de excreção. Conquanto esse prazer, para ser sentido, independa de outra pessoa, afinal a estimulação do ânus é feita pelas próprias fezes, o pequeno animal civilizado humano depende de alguém que limpe seu bumbum, o que faz com que o prazer de defecar passe também a estar ligado a uma pessoa. Lembrando que geralmente quem faz a higiene do bebê é a mãe ou o pai.

O que quero dizer com tudo isso? Que na infância a pulsão sexual está geralmente associada a pessoas bastante específicas: os pais! Nesses primeiros momentos, tradicionalmente chamados de fase oral e fase anal, o sexo dos pais não é relevante, pois o mais importante é o prazer localizado que o bebê sente. No entanto, por volta dos cinco anos, a criança começa a se fazer perguntas acerca da diferença entre homem e mulher e, concomitantemente, a se interessar sexualmente e ter fantasias com o genitor do sexo oposto, iniciando uma relação de rivalidade com o genitor do mesmo sexo. Trata-se do que Freud chamou de “complexo de Édipo”.

Curiosamente, nesse trágico momento, em que as fantasias sexuais em relação ao genitor do sexo oposto começam a se intensificar, a pulsão sexual resolve proclamar trégua e se inicia o período de latência! Como a sexualidade, durante toda a latência, estará num estado de calmaria, o sujeito inevitavelmente recalcará (esquecer-se-á deliberadamente) a paixão que nutria pelo genitor do sexo oposto. Em outras palavras, na latência, a menina não mais se lembrará do seu sonho de casar-se com o papai e tampouco o garoto se recordará dos sonhos que nutria de ocupar o lugar do papai na cama da mamãe.

Quando chega a adolescência e a pulsão sexual novamente se levanta, para-além de ser invadido por tamanha força libidinal, o jovem se vê às voltas com um terrível impasse: por um lado, a cultura lhe diz que ele deve se engajar num processo de busca por alguém que seja ao mesmo tempo do sexo oposto e de fora do seu círculo familiar. Por outro, a retomada da pulsão sexual traz consigo os antigos objetos de amor dos tempos de criança, ou seja, os pais e, especialmente, o genitor do sexo oposto. A diferença é que agora o jovem já está com a proibição do incesto inculcada na sua cabeça, de modo que em vez de experimentar o intenso desejo sexual que nutria pelo genitor do sexo oposto aos cinco anos de idade, ele sente nojo, vergonha, dor psíquica. Ao mesmo tempo, e para desespero do adolescente, como o seu referencial de objeto de amor é o genitor do sexo oposto, toda vez que ele olha para alguém que lhe desperta desejo sexual o que ele vê é o genitor do sexo oposto, ou seja, incesto!

É óbvio que tudo isso não acontece de modo consciente. Portanto, não tente perguntar a nenhuma adolescente se ela fica vendo a imagem do pai em todo garoto pelo qual se interessa. Ela provavelmente lhe dirá que isso é ridículo e que se sente apenas insegura e com medo de levar um fora, mas sequer suspeitará que, por trás dessas racionalizações, há uma fantasia de incesto que ainda roda com bastante força em seu inconsciente. Não obstante, a clínica com sujeitos adolescentes (e adultos) demonstra que essa inferência é plenamente justificada.

Tente, todavia, fazer um exercício mental. Tente se imaginar no inconsciente de um jovem de 13 anos que está apaixonado por uma colega de sala. Você verá que toda vez que ele se imagina ao lado da garota surpreende-se ao constatar que quem de fato está ao seu lado é sua mãe! Ora, não seria natural que esse adolescente não conseguisse sequer se aproximar da jovem?

Pois é exatamente isso o que acontece com inúmeros adolescentes. Sua timidez não é oriunda da situação atual em si, ou seja, ele não é tímido porque teme não conseguir conquistar a garota. Essa é uma modalidade já adulta de timidez. O adolescente não consegue sequer cortejar a garota por que ainda é assombrado pela imagem daquela que na infância fora a rainha de seus sonhos, a mãe. No inconsciente do jovem, a libido ainda está bastante aferrada ao objeto primitivo materno, de sorte que ainda demorará algum tempo até que ele possa contar com uma conta suficiente de libido para investir em outro objeto sexual. Alguns, sequer com a passagem do tempo, conseguem se desvencilhar do fantasma materno. Encontrá-los-emos, provavelmente, no divã.

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Esta obra, fruto de uma pesquisa de mestrado em Teoria Psicanalítica, pretende explorar o incremento do fenômeno das passagens ao ato entre os sujeitos adolescentes. Partimos de um breve estudo sobre a especificidade do trabalho psíquico demandado na adolescência, o qual serve de base para uma reflexão sobre a revivência da situação de desamparo. A partir dessa reflexão, tentamos mostrar como uma eventual convocação do corpo, sob a forma do ato, possui caráter de resposta extrema, à qual o ego pode apelar diante de uma vivência interna de transbordamento pulsional, aliada a um estado de fragilidade narcísica. Tais aspectos, de natureza metapsicológica e psicopatológica, são também articulados com peculiaridades do contexto em que vivem hoje os adolescentes ocidentais. Buscamos demonstrar o quanto a dimensão de desamparo, com toda sua complexidade, tem sido determinante no incremento do fenômeno das passagens ao ato na atualidade. A análise dessa questão é desenvolvida tendo como pano de fundo primordial o âmbito privado da família.

O que é objeto a?

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[Vídeo] Psicossomática e Psicanálise V: Pierre Marty

Psicossomática e Psicanálise V: Pierre Marty

A psicossomática é uma estrutura clínica específica, distinta da neurose, da psicose e da perversão ou indivíduos neuróticos, psicóticos e perversos também podem empregar a doença orgânica como defesa? Essa é a principal pergunta que o psicanalista francês Pierre Marty (1918-1993) procurou responder através de seus estudos com pacientes psicossomáticos. Insatisfeito com as idéias veiculadas nos EUA pelo psicanalista húngaro Franz Alexander na década de 30 acerca das relações entre o inconsciente e doenças somáticas, Marty, juntamente com alguns colegas, fundaram aquela que ficou conhecida como Escola Francesa de Psicossomática. Alexander havia propagado nos EUA uma tese que acabou se tornando parte do senso comum segundo a qual conflitos inconscientes muitos intensos gerariam um estado de tensão tamanha que, ao se tornar crônico, acabaria por prejudicar o funcionamento de determinados órgãos.

Marty discordava dessa idéia, pois suas experiências clínicas lhe mostravam que não havia essa relação mecânica direta entre conflitos inconscientes crônicos e doenças orgânicas. Ele notou que, conquanto muitos pacientes apresentassem conflitos dessa natureza, apenas alguns deles somatizavam, de modo que era preciso supor a existência de outro fator para explicar porque isso acontecia.

O paciente jornalista

Fazendo, a partir da clínica, um minucioso estudo comparativo sobre os pacientes que somatizavam, Marty chegou à conclusão de que tais indivíduos possuíam características específicas que os diferenciavam dos demais pacientes. Foi inevitável, portanto, constatar a existência de uma estrutura psicossomática, com modos de manifestação e defesas singulares. A característica mais explícita do comportamento desses pacientes, observada por Marty e seus colaboradores era o modo como eles faziam uso das palavras durante a análise. Enquanto os neuróticos usavam e abusavam da regra da associação livre para “viajarem”, empregando voluntária e involuntariamente metáforas para falarem sobre suas experiências e dedicavam a maior parte do tempo de análise para falarem de si, de suas fantasias, medos, sentimentos etc., os pacientes somatizantes apresentavam um discurso mecânico, controlado, carente de metáforas e essencialmente voltado para a descrição da realidade externa. Eram uma espécie de jornalistas de seu cotidiano. Já tive contato com pacientes assim: todas as sessões eles te trazem um resumão do que aconteceu na semana anterior, numa linguagem “behavioristicamente” fria. Enfim, para utilizar uma analogia, é como se, na análise, os neuróticos fizessem poesia e prosa e os somatizantes uma mera reportagem.

Vidas no real

Marty observou que esse tipo de discurso pobre era reflexo de um tipo de estruturação psíquica igualmente precária, que ele chamou de “pensamento operatório”, “funcionamento operatório” ou “vida operatória”. Trata-se de um tipo de psiquismo que faz uso das representações como meros instrumentos de descrição da realidade externa. Falta ali, por exemplo, a capacidade para falar e pensar numa caixinha de jóias como símbolo do órgão sexual feminino (Cf. o “Caso Dora” de Freud); uma caixinha de jóias é sempre uma caixinha de jóias nesse tipo de psiquismo. Com Freud, nós aprendemos que a significação sexual de determinado pensamento, fala ou comportamento é resultante do investimento de libido (energia sexual) nesses elementos com vistas à consecução de uma satisfação que não pôde ser levada a cabo na origem, isto é, nos elementos recalcados. Diz-se que a libido se desloca desses para aqueles.

Se, portanto, a fala e o pensamento dos pacientes somatizantes não servem à simbolização, ou seja, não recebem significação sexual, isso significa que tais elementos não são investidos de libido. Freud nos mostrou que a fantasia é o suporte que permite esses investimentos. Com efeito, do ponto de vista freudiano, a fantasia é a construção imaginária que o sujeito produz para se consolar de uma frustração. Lacan, por seu turno, nos fez ver que a nossa relação com o mundo (leia-se: desejo do Outro) é sempre frustrante, o que leva todos nós a erigirmos uma fantasia fundamental que passa a nos servir como uma espécie de viseira que nos impede de nos depararmos com essa frustração inerente à existência. É a partir da fantasia que são produzidas todas as formações do inconsciente (sintoma, atos falhos, lapsos, sonhos etc.) que passam, então, a ser encarregadas de veicular a libido cuja descarga total é sempre frustrada.

Marty notou acertadamente que nos pacientes somatizantes há uma “carência fantasmática”, ou seja, neles falta essa dimensão da fantasia para servir de escoadouro da libido. O que acontece, então, com a energia libidinal, já que ela não tem vazão pela fantasia?

Atuar e adoecer: destinos da libido

Ora, outra lição que Freud nos ensinou é a de que a pulsão sexual está imperativamente direcionada para a descarga, de modo que essa tem que acontecer de uma maneira ou de outra. Logo, se nos pacientes somatizantes a libido não é descarregada pela via fantasmática, isto é, através das representações psíquicas, isso significa que ela se encontra livre e pronta para ser descarregada por onde der. No caso dos pacientes somatizantes, o “gargalo” disponível será, evidentemente, o corpo.

No entanto, a descarga pela via do corpo não significa necessariamente uma doença psicossomática. Em vez da somatização, o sujeito pode fazer uso de uma defesa que Freud chamou de “acting-out”, isto é, uma atuação. Recordo-me de uma paciente com um modo de funcionamento explicitamente operatório que, um mês após ter conhecido pela internet um rapaz que morava num país distante, resolveu ir até ele ignorando completamente os riscos que corria ao fazer uma viagem internacional para encontrar alguém que mal conhecia. “Fui sem pensar”, disse ela. É exatamente essa ação desvinculada de um pensar prévio o que caracteriza a atuação. Essa, no entanto, não protege o sujeito contra a doença psicossomática, a qual se constitui na via privilegiada de descarga de libido nos pacientes de funcionamento operatório.

Concluindo

Para Pierre Marty a doença psicossomática é uma estratégia defensiva empregada por determinados pacientes como forma de se livrar do excesso libidinal que não encontrou descarga através da fantasia e das manifestações decorrentes dela. Tais pacientes não são nem neuróticos, nem psicóticos e nem perversos. Possuem uma estrutura psíquica específica caracterizada por uma carência fantasmática que enseja um funcionamento operatório manifesto em um discurso pobre em simbolização e voltado para a descrição da realidade externa.

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Se você quiser saber um pouco mais sobre as idéias de Pierre Marty, leia gratuitamente o excelente artigo escrito por Wilson de Campos Vieira, “A psicossomática de Pierre Marty” para a coletânea “Psicossoma: psicossomática psicanalítica”, clicando neste link.