[Vídeo] No inconsciente, a gente pensa, reflete, planeja…


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Por que não é saudável manter desejos no inconsciente?

Recentemente, um aluno da CONFRARIA ANALÍTICA, a minha escola de formação teórica em Psicanálise, fez a seguinte pergunta:

“Lucas, por que não é saudável manter certos desejos no inconsciente?”.

Vou desenvolver aqui a resposta que dei a ele.

Em primeiro lugar, é importante esclarecer que essa pergunta só faz sentido no interior do universo teórico freudiano.

Considerando especificamente essa matriz teórica, podemos apontar três motivos básicos pelos quais não é saudável manter um desejo no inconsciente.

(1) Limitação do conhecimento de si

Para Freud, no inconsciente encontram-se desejos que foram REPRIMIDOS, ou seja, anseios que repudiamos e que, portanto, não queremos perceber como nossos.

Nesse sentido, manter desejos no inconsciente significa ficar cego, se alienar, permanecer ignorante de uma importantíssima parte de si mesmo.

(2) Desperdício de energia

Para conservarmos certos desejos em estado de repressão, precisamos gastar muita energia psíquica, já que eles tentam o tempo todo forçar sua entrada na consciência.

Assim, essa grande quantidade de energia empregada no processo de defesa acaba ficando indisponível para ser utilizada em outros propósitos.

Resultado: o sujeito vive limitado, tolhido, muito aquém do que poderia viver, pois  desperdiça parte de suas forças emocionais tentando fugir de si mesmo.

(3) O risco de adoecer emocionalmente

Desejos que estão no inconsciente se manifestam disfarçadamente em nossas vidas de muitas formas: por meio dos sonhos, dos atos falhos, do nosso jeito de ser…

Mas há uma forma privilegiada de expressão deles que é o SINTOMA, ou seja, algo que acontece em nós, que não conseguimos controlar e que nos causa sofrimento.

Nesse sentido, podemos considerar a manutenção de desejos no inconsciente como uma espécie de “fator de risco” para o adoecimento psíquico.

A Psicanálise é um convite para que o sujeito tope o desafio de vivenciar momentaneamente a angústia de expor esses desejos à luz da consciência.

Nossa aposta é a de que vale a pena atravessar essa dor temporária do encontro com a verdade do que manter o sofrimento crônico que resulta do autoengano.


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Fazendo terapia, você pode até não mudar, mas certamente passará a se enxergar melhor.

É claro que a gente procura terapia com o objetivo de mudar, né?

De fato, se buscamos a ajuda de um profissional de saúde mental, é porque queremos perder ou abandonar certos sintomas, inibições etc.

Por outro lado, todo bom processo terapêutico costuma proporcionar outras vantagens para-além das mudanças que desejamos alcançar.

Quase toda terapia, por exemplo, leva o paciente, em maior ou menor medida, a desenvolver aquilo que os americanos chamam de AWARENESS.

Esse é um termo que costuma ser traduzido para o português por “consciência”, mas que não quer dizer simplesmente “perceber conscientemente alguma coisa”.

Awareness significa um tipo específico de percepção que, ao ser conquistada, necessariamente produz transformações no sujeito.

Veja o que aconteceu com a Fernanda, por exemplo:

Ela descobriu na terapia que o modo como se comporta no namoro é muito parecido com a forma com que ela se relacionava com sua mãe na adolescência.

Desde que se deu conta disso, a moça passou a ficar muito mais atenta às reações que costuma ter diante de certos comportamentos do parceiro.

Mais do que isso:

Ela passou até a evitar certas atitudes ao pensar: “Nossa, eu tô querendo fazer com ele exatamente o que fazia com minha mãe”.

A paciente ainda não entendeu por que repete no namoro o padrão de relacionamento com a mãe.

No entanto, o simples fato de ter percebido essa repetição já foi suficiente para que ela repensasse o modo como interage com o namorado.

Isso é awareness!

A experiência de falar sobre si durante quase 1 hora toda semana (ou, às vezes, mais de uma vez por semana) leva o sujeito quase inevitavelmente a se enxergar melhor.

É por isso que, mesmo em processos terapêuticos não muito bem-sucedidos em termos de eliminação de sintomas e inibições, o paciente pode se sentir satisfeito.

Satisfeito com a quantidade de coisas que aprendeu sobre si mesmo ao longo do processo, com a luz que pôde lançar sobre dimensões outrora obscuras de seu ser.

Volto a dizer: a gente vai para a terapia porque quer mudar.

Porém, frequentemente, o simples fato de entenderem como “funcionam” pode ser visto por muitas pessoas como uma conquista EXTRAORDINÁRIA.


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[Vídeo] Uma das razões pelas quais a Psicanálise incomoda

Opondo-se ao nosso apego narcísico à dimensão consciente do psiquismo, o psicanalista propõe a quem o procura um corajoso “exame do Inconsciente”.


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A Psicanálise propõe um exame do Inconsciente

Outro dia, depois que eu lhe pedi para me dizer o que achava que poderia ter servido como gatilho para sua crise de ansiedade, uma paciente me respondeu mais ou menos o seguinte:

— Não sei. Eu já fiz o meu exame de consciência e não encontrei nada.

Quero tomar essa fala como ponto de partida para fazer um comentário sobre uma especificidade da Psicanálise.

“Exame de consciência” é um termo proveniente do Catolicismo. Trata-se de um exercício reflexivo que todo fiel católico deveria fazer antes de se confessar ao sacerdote.

Provavelmente, minha paciente não utilizou tal expressão nesse sentido estrito e religioso, mas simplesmente como sinônimo de reflexão consciente.

Todavia, a resposta que ela me deu é interessante porque ilustra uma das diversas ilusões humanas que a Psicanálise busca demolir.

Nesse caso, trata-se da ilusão de que podemos ter acesso consciente a todos os nossos pensamentos e impulsos motivadores.

Quando minha paciente diz que já fez o seu “exame de consciência” e não encontrou nada que pudesse justificar suas crises de ansiedade, o que ela está sugerindo?

Ora, que não haveria nenhum motivo psíquico para sua ansiedade e que, portanto, suas crises devem ter sido causadas por fatores totalmente físicos (ela disse isso explicitamente, inclusive).

Como uma típica paciente obsessiva, ela se recusa a considerar a possibilidade de que existem elementos psíquicos que não podem ser alcançados por seu “exame de consciência”.

Mas, veja: essa tendência obsessiva de supervalorizar a consciência está presente, em alguma medida, em todos nós.

Esta é uma das razões pelas quais a Psicanálise causa tanto incômodo desde que nasceu lá na final do século XIX.

Opondo-se a esse nosso apego narcísico à dimensão consciente do psiquismo, o psicanalista propõe a quem o procura um corajoso “exame do Inconsciente”.

Para fazê-lo, ao invés de meditar conscientemente sobre sua conduta, o paciente deve simplesmente ESCUTAR-SE, como um mero espectador da própria alma.

Só assim ele será capaz de SURPREENDER-SE consigo mesmo e enxergar pensamentos que jamais imaginou que pudessem habitá-lo.


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Às vezes a gente até enxerga a verdade, mas não consegue aceitá-la…

— Mais uma vez eu não consegui me segurar, Marcela.

Foi com essa fala que Arthur iniciou sua 53ª sessão de terapia com aquela analista.

Sim, ele havia contado.

— Hum… — respondeu Marcela incentivando o paciente a continuar.

— Foi igualzinho como daquela outra vez lá no restaurante: o telefone dela tocou, ela olhou e não quis atender dizendo que devia ser a operadora do celular querendo enfiar alguma promoção.

— E aí?

— Aí o de sempre, né? Eu não consigo acreditar, não sei por que… Falei para ela me dar o telefone que eu queria ver o número.

— E ela te deu?

— Dessa vez, não. Ela falou que não aceitaria mais aquilo, que ou eu confiava nela ou a gente não ficaria junto. Aí eu comecei a falar mais alto, pedindo o celular e tentando tirar da mão dela.

— Onde vocês estavam?

— Na fila do cinema… As pessoas começaram a olhar, mas mesmo assim ela não queria me dar o telefone de jeito nenhum. Aí eu fiquei tão nervoso que saí da fila e deixei ela lá sozinha.

— Do mesmo jeito que a sua mãe fazia com o seu pai, né? — lembrou a analista.

— Exatamente… Mas como é que muda isso, Marcela? Eu já entendi que, de certa forma, eu tô reproduzindo o mesmo ciúme doentio da minha mãe, mas e aí?

— É curioso que você só tenha percebido isso aqui em análise, não acha?

— É… Eu sempre fui ciumento e desde criança vejo as loucuras de ciúme da minha mãe, mas foi só conversando com você que liguei uma coisa com a outra.

— Por que será que você passou anos sem conseguir fazer essa conexão?

— Não faço a menor ideia…

— Talvez essa resistência a se perceber parecido com sua mãe ainda não tenha sido vencida. Uma coisa é enxergar a verdade, outra é aceitá-la…

Com essa intervenção, a terapeuta Marcela pretende mostrar ao paciente que a mera tomada de consciência não é suficiente para produzir a melhora clínica desejada.

Quem está na CONFRARIA ANALÍTICA receberá hoje uma aula especial que trata justamente desse assunto.

O título dela é “LENDO FERENCZI 06 – Reconhecer o recalcado não é suficiente” e está disponível no módulo “AULAS ESPECIAIS – FERENCZI”.


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4 atributos do pensamento inconsciente

No artigo metapsicológico “O Inconsciente”, que estamos terminando de estudar linha a linha lá nas aulas ao vivo da CONFRARIA ANALÍTICA, Freud apresenta 4 características dos processos de pensamento no Inconsciente.

Muita gente não sabe, mas o Inconsciente NÃO é um lugar obscuro e misterioso dentro de nós, cheio de emoções reprimidas.

Na verdade, o Inconsciente nada mais é que um sistema psíquico.

E, como tal, constituído de PENSAMENTOS.

Isso mesmo: pensamentos, isto é, ideias, representações, desejos, memórias etc.

— Uai, Lucas, mas, então não tem diferença entre o Inconsciente e a Consciência? Porque, pelo que você tá falando, tem pensamento tanto em um quanto no outro…

Sim, caro leitor.

Só que os pensamentos inconscientes funcionam de uma maneira bem diferente dos pensamentos que estão localizados na Consciência (ou melhor, no Pré-consciente, que é o nome técnico que a Psicanálise dá para o sistema psíquico onde ficam armazenadas as ideias das quais a gente pode tomar consciência).

Veja nos cards quais são as particularidades dos processos de pensamento no Inconsciente.


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As raízes do sentimento de culpa

Quero iniciar este texto propondo uma definição de culpa. Não pretendo ser exaustivo e contemplar todos os aspectos dessa emoção, mas apenas destacar o que me parece ser o seu traço mais essencial.

Defino culpa como o sentimento que a maioria de nós experimenta quando percebe que causou dano a um objeto que valorizamos. Esse objeto pode ser uma pessoa, um animal, uma instituição ou até… o nosso próprio ego. Quando nos sentimos culpados, por exemplo, por fazer algo incompatível com nossos parâmetros morais, mas que não causou prejuízo a nenhuma pessoa, quem sofre o dano nesse caso é a imagem que desejamos ter de nós mesmos, o nosso ego ideal.

O fato de nos sentirmos culpados mesmo quando ninguém está sendo efetivamente prejudicado evidencia que a culpa não é um afeto que brota espontaneamente da percepção do sofrimento do outro em função do dano causado a ele. Com efeito, uma mulher pode se sentir culpada por trair seu marido mesmo que o companheiro jamais saiba do chifre. Ou seja, a culpa que ela experimenta ocorre independentemente da dor que acometeria o marido caso ele fosse informado do adultério.

Esse exemplo nos permite discernir um aspecto crucial da culpa: na verdade, o verdadeiro motor desse sentimento é a consciência moral e não propriamente a realidade. É por isso que muitas pessoas se sentem culpadas meramente por desejarem certas coisas ou fantasiarem situações. Embora nada tenha acontecido na prática, mesmo assim elas se sentem culpadas.

A culpa, portanto, pode ser vista como a PUNIÇÃO que nossa consciência moral nos aplica por desobedecermos, concreta ou imaginariamente, suas leis. Em outras palavras, quando nos sentimos culpados, é como se estivéssemos sendo colocados “de castigo” por nossa consciência moral. Essa analogia nos permite compreender por que a culpa é tão dolorosa. De fato, é como se estivéssemos recebendo uma surra da consciência por nossas “malcriações”.

Foi justamente pensando nessa analogia que anteriormente fiz uma live no Instagram defendendo a tese de que CULPA É COISA DE CRIANÇA, ideia à qual pretendo voltar em outra postagem.


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[Vídeo] Superego: explicação definitiva

Você quer entender o conceito de superego em Psicanálise? Então, este vídeo foi feito exatamente para você! Este é o terceiro episódio da série em que explico a segunda tópica do aparelho psíquico de Freud.

Dica de leitura:

Diante da importância do superego, tanto no nível da metapsicologia e da psicopatologia quanto no de suas implicações no domínio do tratamento, é realmente pertinente e proveitoso consagrar-nos ao seu estudo. Neste livro, trata-se de pôr à prova a dupla polaridade, clássica, do superego; por um lado, uma instância de proibição; por outro, uma instância que extrai sua força das pulsões.

O eu é uma ilusão

No último post apresentei ao leitor um pouco da vida e do pensamento do médico e psicanalista Georg Groddeck (1866-1934). Trata-se de um autor cuja obra, injustamente e a despeito de sua originalidade e relevância, jamais obteve o devido reconhecimento por parte das ciências humanas.

Tratando de pacientes com doenças físicas, Groddeck teve acesso de forma inteiramente autônoma aos mesmos curiosos fenômenos que levaram Sigmund Freud, criador do método psicanalítico, a formular o conceito de Inconsciente.

Neste artigo desejo explorar alguns aspectos interessantes do pensamento de Groddeck relativos à noção de “eu” a fim de demonstrar seu ponto de vista acerca da subjetividade. Estou certo de que as questões e problemas colocados pelo autor são ótimas contribuições para uma reflexão atual sobre a nossa identidade em mundo habitado cada vez mais por perfis, avatars, faces

Rumo a Deus-Natureza

Como disse no texto anterior, além da dedicação à arte de curar, Groddeck também nutria uma forte paixão pela literatura, herança de seu avô e de sua mãe. Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), o maior poeta da língua alemã, era decerto um de seus autores preferidos.

Com efeito, Goethe, além de insigne escritor, também se interessava por ciência e filosofia. Inspirado pelas ideias de Benedictus de Spinoza (1632-1677), filósofo que chocara seus contemporâneos ao propor a tese de que Deus não é um ente separado e transcendente à Natureza, mas é a própria Natureza, Goethe formulara o conceito de Deus-Natureza (Gottnatur). Todavia, contrariamente à Natureza de Spinoza, o Deus-Natureza de Goethe correspondia à ideia romântica de “mãe natureza”, que cria e sustenta tudo o que há no mundo de acordo com uma finalidade pré-determinada.

Como prova de sua veneração ao poeta, Groddeck escreve em 1909 um ensaio chamado “Rumo a Deus-Natureza” (“Hin zu Gottnatur”), texto que já indica as futuras elaborações teóricas do médico. De fato, nesse texto encontra-se a ideia que está presente tanto na filosofia de Spinoza quanto nos escritos de Goethe e à qual Groddeck também chega a partir de sua experiência clínica, a saber: a de que, na verdade, aquilo que nós chamamos de “eu” não passa de uma miragem, de uma ilusão, de um engodo!

Uma ilusão necessária

Por que estamos tão seguros de que somos um “eu”, ou seja, de que cada um de nós é um indivíduo distinto e absolutamente separado do restante do mundo? Para Groddeck, não há nada que nos dê qualquer garantia disso. Malgrado os mais recentes avanços da ciência, ainda não somos (e talvez jamais sejamos) capazes de saber ao certo quando o “eu” passa a existir. Será a partir do nascimento? Desde a concepção? Mas e o que antecede o encontro dos gametas? Se continuássemos a fazer tais perguntas, diz Groddeck, chegaríamos ao ponto de admitir que, no limite, o “eu” de cada um de nós já está de algum modo presente nos nossos ancestrais mais longínquos!

Igualmente, não chegaremos a nenhuma conclusão definitiva caso tentemos afixar os limites espaciais do nosso “eu”. Afinal, como Groddeck costumava dizer, jamais saberemos o exato momento em que um pedaço de pão que comemos se torna parte do nosso “eu” ou quando um determinado som que por ventura ouçamos deixa de ser um elemento exterior e passa a nos constituir.

Ao fazer tais indagações, Groddeck pretende desnudar o caráter ilusório de nossa individualidade, demonstrando que, na verdade, cada um de nós é apenas um modo de expressão da Natureza, isto é, estamos radicalmente inseridos nela, somos uma parte indissociável do todo, um imenso conjunto de relações. Em decorrência, entre o mundo e o que nós chamamos de “eu” não há de fato uma separação, mas uma relação de continuidade. Como diria Renato Russo, somos como gotas d’água, grãos de areia.

Groddeck, contudo, reconhece que a ideia de que somos um “eu” separado, dissociado, independente do resto da Natureza é difícil de ser abolida. Com efeito, é ela que sustenta a crença de que somos livres e responsáveis por nossas escolhas e ações – aspecto inegavelmente útil para a convivência em sociedade. Ademais, com exceção talvez daqueles que após se submeterem a experiências místicas afirmam ter provado a sensação de “serem um com o todo”, a grande maioria de nós jamais conseguiu se desvencilhar do sentimento de ser um “eu” separado do mundo.

Levando tudo isso em conta, Groddeck conclui que, conquanto objetivamente se possa dizer que o “eu” ou a noção de “indivíduo” seja uma quimera, o sentimento de ser um “eu”, livre, autônomo, consciente e responsável por seus atos parece ser um elemento atávico em nós, ou seja, impossível de ser eliminado. Para o médico, a Natureza, tendo em vista a utilidade da crença no livre-arbítrio e na responsabilidade individual, teria forjado no ser humano esse sentimento de individualidade.

Não obstante, Groddeck acuradamente ressalta as grandes limitações que uma noção reduzida do “eu” pode trazer para a compreensão de nossa existência. De fato, se nos ativermos apenas ao que sabemos conscientemente, teremos acesso somente a uma porção ínfima das causas que influenciam nossas decisões e comportamentos. Assim como não somos capazes de controlar deliberadamente a maioria dos processos fisiológicos que acontecem em nosso corpo – ninguém pode, por exemplo, determinar a quantidade de nutrientes que serão absorvidos na corrente sanguínea – assim também não estamos conscientes da série de fatores que condicionam nossas ações e atitudes aparentemente “livres”.

Nesse sentido, nos encontramos sempre mais ou menos “alienados” em relação às causas de nossos comportamentos e tal “alienação” ou “inconsciência” tenderá a ser tanto maior quanto mais reduzida for a concepção que temos de nós mesmos como indivíduos. Em outras palavras, nossa “alienação” aumenta quanto mais reduzimos o que somos ao nosso “eu”, ou seja, àquilo de que temos consciência. Foi justamente por esse motivo, e com o intuito de propor uma concepção de ser humano a mais abrangente e menos “alienada” possível, que Groddeck forjou, em oposição à ideia de “eu”, o conceito de “Isso”. Mas Isso é assunto para um próximo post.

***

Este artigo foi originalmente publicado em Benedita, ano 1, n. 2, julho de 2012.

Id, ego, superego: entenda a segunda tópica de Freud (parte 2)

Como disse na introdução da primeira parte do texto, meu objetivo aqui é, sobretudo, o de desfazer alguns mal-entendidos que com muita frequência se fazem presentes na leitura que o senso comum e a psicologia geral fazem dos conceitos de id, ego e superego.

Nesta segunda parte, ainda não abordarei diretamente a tríade, pois, como eu também disse anteriormente, é preciso compreender o que levou Freud a introduzir a segunda tópica. E é justamente isso o que verá no texto abaixo. Em termos mais específicos, você aprenderá:

(1) Que Freud, conquanto fosse um terapeuta, nunca deixou de formular hipóteses acerca da organização do psiquismo;

(2) Que a chamada “primeira tópica” (Consciente, Pré-consciente, Inconsciente) foi uma hipótese desse tipo;

(3) Que a clínica acabou revelando que a primeira tópica era insuficiente, principalmente o termo “Inconsciente”.

Vejamos agora, tudo isso, detalhadamente:

Sabe-se que Freud, embora tenha inventado um método de tratamento das neuroses, a psicanálise, jamais deixou de lado o seu desejo de ser um cientista. É por isso que desde o início de sua obra encontramos não apenas descrições e análises de experiências da clínica, mas também tentativas de sistematizar a estrutura e o funcionamento do psiquismo.

O primeiro esboço de uma formulação teórica dessa natureza se encontra no chamado “Projeto para uma Psicologia Científica”, um livrinho escrito em 1895, que Freud deixou engavetado e só foi descoberto mais de uma década depois de sua morte. Naquele texto, Freud propunha a ideia de que o aparelho psíquico estruturava-se segundo uma divisão entre tipos específicos de neurônios e funcionava a partir da tendência geral a descarregar a energia produzida pelos estímulos externos e internos. Não nos deteremos nessa primeira concepção, pois ela não está diretamente associada ao surgimento dos conceitos de id e superego, embora no “Projeto” o termo ego já apareça. De todo modo, o sentido que Freud dera ao conceito naquele texto é consideravelmente distinto do postulado em “O Ego e o Id”.

A segunda tentativa de Freud de descrever a estrutura e o funcionamento mentais remonta aos seus primeiros estudos sobre a histeria ainda contando com a companhia de Breuer. Nesse segundo momento, Freud utiliza a capacidade de uma representação mental tornar-se consciente como critério para a divisão do aparelho psíquico. O psiquismo comportaria, então, três “territórios” os quais, é preciso que se diga, não possuem correspondência com a anatomia do cérebro, ou seja, são conceitos metapsicológicos, como dizia Freud.

A primeira tópica

Os três “reinos” da mente seriam: o consciente (Cs.), o pré-consciente (Pcs.) e o inconsciente (Ics.). No Cs. estariam as representações mentais das quais estamos plenamente conscientes no momento, o que faz dessa instância psíquica uma dimensão em permanente metamorfose, pois a todo momento novas representações mentais estão se tornando conscientes e deixando de sê-lo. No Pcs. se localizariam aquelas representações que podem vir a ser conscientes, mas que no momento não estão em nossa consciência. Já no Ics. estariam as representações que já estiveram no consciente e/ou no pré-consciente, mas que de lá foram expulsas por causarem muita angústia. Por conta disso, não podem mais tornar-se conscientes sem que se aplique uma considerável dose de trabalho, sendo que algumas jamais poderão novamente ser conscientizadas em função da alta carga de angústia que produzem.

Essa divisão do aparelho psíquico ficou conhecida na teoria psicanalítica como primeira tópica, pois se trata da primeira tentativa freudiana de descrever quais seriam, por assim dizer, os diferentes “lugares” (topos) do psiquismo.

Por que Freud não ficou satisfeito com a primeira tópica?

A primeira tópica se mostrou bastante útil para Freud quando a psicanálise estava direcionada primordialmente à compreensão das formações do inconsciente e da natureza das representações mentais que causavam angústia e eram recalcadas. Todavia, quando o foco da pesquisa psicanalítica começou a ser orientado para o ego – a instância do psiquismo que, por não suportar a angústia gerada por determinadas representações mentais, as mandava para o inconsciente – essa divisão do aparelho psíquico em consciente, pré-consciente e inconsciente começou a se mostrar insuficiente. Vejamos por que.

Até então, Freud achava que o ego estava totalmente situado no consciente e no pré-consciente, afinal no inconsciente estariam apenas aquelas representações mentais que o ego teria recalcado. Em outras palavras, naquele momento Freud considerava que o conflito psíquico que levaria ao adoecimento psicológico seria travado entre um ego consciente que não quer admitir determinados pensamentos e o conjunto inconsciente desses pensamentos recalcados, ou seja, um conflito ego versus inconsciente.

No entanto, a experiência clínica foi mostrando a Freud que uma parte considerável do ego também era inconsciente. Como Freud descobriu isso?

Ora, durante uma análise, o sinal clínico que evidencia que determinados pensamentos e recordações estão no inconsciente, ou seja, de que foram recalcados, é a dificuldade do paciente de se lembrar deles ou de falar sobre o assunto. Freud compreendia essa situação considerando que haveria uma resistência do ego bloqueando o acesso das representações mentais recalcadas e/ou de seus substitutos. O curioso, contudo, é que o próprio paciente não teria consciência de que estava empregando essa resistência! Logo, a resistência não seria um fenômeno consciente, embora fosse uma função do ego. Conclusão: o ego não é totalmente consciente. Além disso, as resistências se comportariam de modo semelhante às representações recalcadas, isto é, demandariam certa dose de trabalho para que fossem tornadas conscientes.

Essa descoberta jogou por terra a hipótese de que o conflito psíquico se fundamentaria numa oposição entre ego e inconsciente. No entanto, isso não significaria admitir que o ego não fosse um dos polos do conflito psíquico. De fato, mesmo sendo inconsciente, a resistência continuava a ser um fenômeno produzido pelo ego. O problema estava em sustentar que o outro polo do conflito seria o inconsciente, afinal descobrira-se que uma parte do ego também era inconsciente. E agora, o que fazer?

Sugestões de leitura:

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Reflexões sobre o sujeito em Psicanálise

Meu objetivo com este texto é modesto. Pretendo apenas “pensar em voz alta” acerca do significado que o termo “sujeito” assume na teoria psicanalítica.

No senso comum acostumamo-nos a utilizar a palavra sujeito como sinônimo de pessoa ou indivíduo do sexo masculino, como quando dizemos: “Aquele sujeito é muito rabugento”. Ninguém se refere a uma mulher designando-a como um sujeito, dizendo, por exemplo: “Aquela sujeito é linda!”. As razões pelas quais essa divergência ocorre talvez sejam assaz interessantes de serem avaliadas, mas aqui não é o momento para tal. Quero enfatizar apenas que no linguajar ordinário a noção de sujeito se confunde com a de indivíduo ou pessoa do sexo masculino.

Não obstante, ela guarda certo parentesco com o sentido que o termo adquire no campo em que foi formulado como conceito, a saber: a Filosofia. De fato, não há sujeito – enquanto conceito – antes de Descartes. Foi ele o inventor do “eu” moderno, idéia tão banal para nós hoje que nem nos damos conta de que, em verdade, trata-se de uma invenção. Foi o filósofo francês quem, rompendo com o modo de pensar medieval, nos brindou com a tese revolucionária de que não somos apenas objeto da vontade divina e das contingências da realidade, mas que transcendemos a tais condicionamentos, isto é, temos autonomia, podemos ser tomados como causa de nossos próprios atos. Enfim, somos sujeitos de nossos predicados e não predicados do sujeito divino!

Essa idéia nos é tão familiar hoje em dia que temos dificuldade em imaginar um mundo em que ela não existia. Todavia, a Idade Média sobreviveu durante centenas de anos sem necessidade da noção de sujeito, assim como ainda hoje muitas culturas ditas “primitivas” funcionam da mesma forma, confirmando o fato de que a noção de sujeito não nos é dada pela natureza, mas requer um exercício intelectual demandado pelas condições de uma determinada organização sócio-histórica. No caso da era medieval, o conceito de sujeito era supérfluo: se Deus explicava tudo não havia porque supor no homem a existência de um eu irredutível, não-condicionado, transcendendo às vicissitudes da realidade.

Mas a Modernidade demandou a invenção desse conceito – e Descartes o fez. E é com base nessa noção que a Modernidade trabalhou, instituindo a ciência moderna, a categoria dos direitos universais do homem e valores como a liberdade, por exemplo, implausível sem o conceito de eu, de sujeito que, nesse sentido, como no senso comum, pode ser associado ao de pessoa e de indivíduo.

E do século XVII, quando Descartes enuncia a invenção do sujeito, até meados do século XVIII a humanidade sobreviveu crente na existência de um sujeito autônomo, livre e consciente dos seus atos. Mas a realidade social, em constante mudança, solicita novamente uma transformação conceitual. A idéia de um eu, de um sujeito, de um indivíduo, tão palatável no crepúsculo da Idade Média e tão esperançosa face ao teocentrismo até então reinante, passa a mostrar sinais de fragilidade. Tiramos Deus de cena e instituímos o homem como eixo do mundo – e nem por isso as coisas melhoraram. Será que a idéia de que somos sujeitos de nossos atos não é uma ilusão? É essa a pergunta-chave que começa a ser feita em meados do século XIX e cuja resposta se desdobrará no nosso momento atual que muitos denominam de pós-modernidade.

Freud foi um dos arautos dessa pergunta à humanidade. E a resposta que ele encontrou, na esteira de Nietzsche e Schopenhauer – os quais também colocaram o eu em xeque – foi afirmativa: sim, nos enganamos acreditando que éramos o centro de nós mesmos. Há um pensamento que ocorre nos nossos bastidores e condiciona o que acontece no palco da nossa vida. Nós estamos ali simultaneamente como meros atores e espectadores do desenrolar da cena – eis a tese capital de Freud.

Entretanto, junto com essa tese que permitirá o desenvolvimento do método psicanalítico, surge um impasse: se a cena da nossa vida é condicionada pelo que ocorre nos bastidores e não por nós mesmos, quem é o diretor da cena? A saída de Freud, posteriormente formalizada por Lacan, foi genial: ele não atribuiu ao inconsciente o estatuto de sujeito, ou seja, não substantivou o inconsciente, como poderia se esperar que fizesse à moda de um Schopenhauer, que instituiu a Vontade cega da vida como sujeito fundamental. Não se esqueçam que Freud, antes de tudo, queria ser um cientista. E, por conta disso, ele teve que ser inventivo para não estraçalhar Descartes, o pilar da ciência moderna, com sua descoberta. Assim, em vez de prescindir do sujeito cartesiano, Freud o subverteu (para usar o termo lacaniano). Ou seja, o pai da psicanálise não delegou ao inconsciente a causa da intencionalidade, como o público leigo ainda hoje pensa. É justamente esse mal-entendido que fundamenta a já batida frase: “Freud explica”. Freud não explica nada. É a própria pessoa que se explica!

Freud, por seu turno, mantém o conceito de sujeito, mas o subverte, concebendo-o não mais como autoconsciente, mas sim como dividido. Assim, a “parte” consciente do sujeito se estabelece à custa de um desconhecimento da outra “parte” (inconsciente). Essa, por sua vez, comporta desejos que se manifestam à revelia daquela. É justamente por isso que a psicanálise não abdica da responsabilização do analisando por aquilo que faz. Muita gente pensa que pelo fato de a psicanálise trabalhar com a idéia de inconsciente isso significa que ela destitui da pessoa a responsabilidade dos seus atos atribuindo-a ao inconsciente. Nada mais falacioso. O inconsciente é apenas a qualidade psíquica de determinados pensamentos que possuem como ponto de partida, em última instância, o sujeito. São inconscientes precisamente por terem sido afastados da consciência pelo próprio sujeito.

A grande novidade de Freud foi ter proposto a idéia de que o sujeito não precisa ser necessariamente consciente de suas intencionalidades. Em outras palavras, para a psicanálise, sujeito não é aquele que sabe o que está fazendo, mas, pelo contrário, aquele que responde por aquilo que faz sem saber por quê.

O que é superego? (parte 1)

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