Quais são as dores de cabeça que você está escolhendo suportar?

Lá em 2017 eu ministrei uma palestra com meu amigo @leonardosandroficial sobre os desafios da escolha profissional para adolescentes que estavam no Ensino Médio.

Na ocasião, o Léo proferiu uma máxima para aqueles jovens que fez morada na minha memória de longo prazo. Era algo mais ou menos assim:

— Toda profissão lhes trará dores de cabeça. Então, vocês precisam escolher quais dores de cabeça estão dispostos a ter.

Pois bem, penso que esse mesmo raciocínio que o meu amigo utilizou no campo da escolha profissional vale também para o âmbito das nossas escolhas AMOROSAS.

Não, eu não estou falando de paixão ou atração.

Essas coisas não estão sob o nosso controle. Nós não somos capazes de DECIDIR conscientemente por quais pessoas vamos nos apaixonar ou nos sentir atraídos.

Ao falar de “escolhas amorosas”, estou me referindo àquela DECISÃO (essa, sim, consciente) de entrar e se manter numa relação de LONGO PRAZO com uma determinada pessoa.

Ora, no mundo moderno, todo relacionamento desse tipo nasce da paixão ou, no mínimo, de uma forte atração entre os parceiros.

O problema é que a paixão inevitavelmente acaba após alguns meses (às vezes mais, às vezes menos) e a força da atração é consideravelmente atenuada pelo fenômeno que o @igormadeirapsi chamaria de “habituação”.

Nesse sentido, o que sustenta a manutenção de uma relação de longo prazo não são os afetos que impulsionaram a criação do vínculo.

São vários outros fatores.

Alguns deles são involuntários, como o apego, a estabilidade, a própria atração (que geralmente permanece, ainda que menos intensa), processos inconscientes etc.

Por outro lado, um relacionamento de longo prazo também se mantém graças à disposição dos parceiros de suportarem as “dores de cabeça” que ambos geram um ao outro.

Por “dores de cabeça” leia-se aqueles traços e comportamentos de cada um que perturbam o outro, causando incômodo, frustração, tristeza, raiva etc.

Nesse sentido, assim como escolher uma profissão é escolher as dores de cabeça profissionais que eu topo enfrentar, escolher uma parceria amorosa também significa escolher as dores de cabeça RELACIONAIS que eu estou disposto a suportar.


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[Vídeo] A libido não é infinita

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Estamos estudando linha a linha o texto de Freud “Sobre o narcisismo: uma introdução”.

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[Vídeo] Todo homem é meio gado?

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A Psicanálise explica a paixão?

Não é por acaso que esta sexta-feira é chamada “Sexta-feira da Paixão”.

Com efeito, uma das traduções de PATHOS, a palavrinha grega da qual se origina o termo paixão, é SOFRIMENTO e a cristandade rememora hoje justamente a dor implicada no sacrifício redentor do Messias.

Paixão, portanto, pode ser sinônimo de padecimento, martírio, aflição…

Qualquer pessoa que já se apaixonou na vida — e não teve seu amor correspondido — sabe muito bem disso.

Por outro lado, quem teve a sorte de contar com o desejo recíproco do objeto amado pode atestar a alegria indizível que emerge, feito torrente, de um coração apaixonado — incontrolável, avassaladora, deliciosamente angustiante.

Será que podemos traduzir essa avalanche emocional que está em jogo na paixão em termos metapsicológicos?

Em outras palavras, será que a Psicanálise pode explicar a paixão?

Essa pergunta é pertinente porque, quando estamos apaixonados, nosso psiquismo sofre alterações profundas que beiram os limites da loucura.

Por exemplo: a gente passa a enxergar a pessoa que amamos como perfeita, sem mácula, indefectível (com ou sem o vestidinho preto de Chico Amaral e Samuel Rosa).

A coisa é tão maluca que, em certos casos, a gente é capaz até de cometer crimes se isso for do agrado do objeto que agora manda e desmanda em nosso coração.

Só quem nunca se apaixonou pode colocar isso em dúvida.

De fato, no início dos anos 2000, um rapaz foi capaz de, juntamente com seu irmão, esp4nc4r os pais de sua namorada até a m0rt3 atendendo a um pedido dela…

Quem soube muito bem capturar esse estado de semiloucura gerado pela paixão foi a escritora portuguesa Florbela Espanca, no poema “Fanatismo”, brilhantemente musicado por Fagner.

Nos últimos versos ela diz, dirigindo-se ao objeto amado:

“Ah! podem voar mundos, morrer astros,

Que tu és como Deus: princípio e fim!…”

Mas, e então, será que a Psicanálise explica esse desvario do apaixonamento?

A resposta é… Sim! E quem está na Confraria Analítica receberá ainda hoje uma aula especial justamente sobre esse tema.

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Amar é querer pegar, mas também é não querer largar

Podemos distinguir dois aspectos no amor: o desejo e o apego.

Por um lado, dizemos que amamos alguém ou algo quando queremos nos aproximar desse objeto e tê-lo conosco. Essa é a faceta desejante do amor. Para que ela se manifeste, precisa haver uma LACUNA entre o sujeito amante e o objeto amado, ou seja, é preciso que o objeto FALTE ao sujeito. Só desejo comer uma picanha quando não estou com ela diante de mim, evidentemente.

Muitas pessoas se equivocam imaginando que o amor se resume a esse movimento desejante. Assim, acreditam que o amor se esvai quando o desejo desaparece. Tais pessoas não conseguem perceber que o apagamento do desejo é uma consequência natural e inevitável ocasionada pela presença constante do objeto. Se elas se desesperam ou se entristecem ao notarem que o desejo se dissipou é porque não conseguem discernir com clareza a outra dimensão do amor: o APEGO.

Diferentemente do desejo, o apego não nasce da falta, mas justamente da PRESENÇA do objeto. Só nos apegamos àquilo que temos. Adriana era ávida por Lourival antes de namorá-lo. Após cinco anos de relação, essa avidez desejosa já não existe mais. No entanto, Adriana sofreria se fosse deixada por Lourival. Essa provável dor é a marca de que a jovem o ama apesar de não mais desejá-lo com o vigor de outrora. Adriana é apegada ao objeto presente que hoje está ao seu lado e que no passado lhe faltava.

Compreender que o amor se manifesta tanto como desejo pelo que não temos quanto como apego pelo que temos é uma daquelas conquistas que tornam a vida bem menos complicada.

[Vídeo] Como esquecer um amor: psicanalista explica

Entenda como funciona o mecanismo do esquecimento e utilize-o a seu favor para superar definitivamente aquele amor do passado.

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Metapsicologia da paixão

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O processo de apaixonar-se certamente é um dos fenômenos mais comuns e fascinantes da experiência humana. Como se sabe, a palavra “paixão” está vinculada etimologicamente ao vocábulo grego “pathos” que poderia ser traduzido livremente por doença, enfermidade, sofrimento – daí a nossa conhecida patologia. De fato, embora geralmente seja fonte de grande prazer para o indivíduo, o estar apaixonado também envolve frequentemente certo grau de sofrimento, especialmente nos casos em que o objeto não corresponde ao amor que lhe é endereçado. Por outro lado, mesmo nos casos em que o desejo entre os parceiros é recíproco, ainda assim a experiência da paixão chega a produzir estados de angústia que só são superados após certo tempo de relacionamento.

Ao introduzir na teoria psicanalítica a noção de “narcisismo primário” num artigo clássico de 1914, Freud acabou lançando luz sobre o que acontece, do ponto de vista metapsicológico, com uma pessoa que se encontra apaixonada. Inicialmente, tentaremos explicar em humanês o que o fundador da psicanálise tinha em mente ao propor a noção de um narcisismo primário. Em seguida, demonstraremos como esse conceito permitiu a Freud inferir os mecanismos psicológicos que estariam por trás do fenômeno do apaixonar-se.

Centro do mundo

Até o momento em que Freud publicou esse artigo que eu mencionei de 1914 chamado “Sobre o narcisismo: uma introdução”, o narcisismo era compreendido pela psiquiatria da época unicamente como um transtorno da sexualidade caracterizado pelo fato de o indivíduo nutrir desejos eróticos por si mesmo. Como, do ponto de vista freudiano, a sexualidade não estava restrita ao campo da genitalidade, mas englobava tudo o que tivesse a ver com o amor num sentido amplo do termo, Freud logo percebeu que o “amor por si mesmo” não era uma prerrogativa apenas de determinados perversos. Em outras palavras, o narcisismo, tomado num sentido mais amplo, era um fenômeno passível de ser encontrado em todas as pessoas. Todas as pessoas tomariam a si mesmas como objeto de amor, em maior ou menor grau. A pergunta que Freud buscou responder no artigo foi: por que isso acontece, isto é, por que nós amamos a nós mesmos?

Atento ao lugar privilegiado que os bebês ocupavam nas famílias ocidentais modernas, o médico vienense formulou a seguinte hipótese: nós amamos a nós mesmos como forma de resgatar a primeira experiência que tivemos na vida: a de sermos plenamente, integralmente, completamente amados pelas pessoas que estão ao nosso redor. Ora, não é isso o que acontece com a maioria dos bebês quando nascem? O próprio Freud, no artigo, brinca dizendo que o bebê torna-se uma verdadeira majestade no ambiente familiar. Para ele são dirigidas todas as atenções, todas as expectativas, todos os projetos. É essa experiência inicial de ser o centro do mundo que Freud chamou de “narcisismo primário”. Quando esse momento se encerra, é como se ficássemos como um “gostinho de quero mais” e passássemos a vida inteira tentando de alguma forma reproduzi-lo. Para alcançar isso, Freud diz que nós forjamos uma imagem idealizada de nós mesmos (eu ideal) que caso fosse de fato encarnada nos proporcionaria a mesma experiência de ser o centro do mundo que tivemos quando bebês.

Amo-me em ti

O que tudo isso tem a ver com o estar apaixonado? Ao observar a fenomenologia da paixão, Freud chega à conclusão de que, na verdade, amar seria uma forma indireta (talvez pudéssemos até dizer: sintomática) de buscar o retorno da experiência de narcisismo primário. Quando estamos apaixonados, idealizamos os traços do objeto amado, colocando-o no centro de nossa existência, ou seja, fazemos com o objeto exatamente aquilo que o mundo fez conosco quando éramos bebês – experiência que gostaríamos de vivenciar ininterruptamente. É como se idolatrando e idealizando o objeto amado pudéssemos vivenciar indiretamente a experiência de sermos amados plenamente.

Trata-se de um fenômeno paradoxal, pois, como Freud assinala, o indivíduo apaixonado se apresenta humilde, não raro sem demonstrações de amor próprio. Grande parte da sua libido, que anteriormente estava investida em si mesmo e na imagem idealizada de si mesmo (seu eu ideal) agora passa a ser dirigida ao objeto. O indivíduo não se sente digno de elogios ou favores. Somente o objeto deve ser servido e adorado. Nesse sentido, do ponto de vista freudiano, ao se apaixonar o indivíduo abre mão de seu narcisismo, mas para recuperá-lo de forma indireta e bem mais potente no objeto amoroso idealizado. Dito de outro modo, para Freud, amamos o outro para melhor amarmos a nós mesmos.

Por que muitos adolescentes atravessam uma fase de excessiva timidez em relação ao sexo oposto?

Diferentemente do que insistem em dizer os médicos e psicólogos, de acordo com o saber psicanalítico (que, a propósito, é derivado da clínica), a adolescência não é o primeiro momento de manifestação da sexualidade.

Guerra e paz
Freud demonstrou que a sexualidade já se faz presente desde o nascimento e, sobretudo, nos primeiros cinco anos de vida se apresenta de modo bastante intenso. Nesse primeiro momento de irrupção da pulsão sexual, a libido circula predominantemente por zonas do corpo que estão mais diretamente ligadas às necessidades básicas do indivíduo, a saber: a boca e o ânus. É só na puberdade que os órgãos genitais irão adquirir proeminência como zonas de excitação sexual e, ainda assim, por uma necessária intervenção da cultura.

Nesse sentido, o período da adolescência testemunha um segundo movimento de expressão aguda da pulsão sexual. Entre mais ou menos os cinco ou seis anos de idade e a puberdade (por volta dos dez ou onze anos) estabelece-se um período que Freud chamou de “latência”, pois durante essa faixa de tempo a pulsão sexual estaria num período de relativa calmaria, permitindo ao sujeito internalizar de modo tranqüilo os ensinamentos morais e educacionais que lhe são impostas pelos pais e pela sociedade. Na adolescência, esse período de “trégua” da pulsão sexual é abruptamente desfeito e a sexualidade retoma suas armas com uma força tão grande que chega a assustar o jovem que, em função do período de latência, esquecera-se de que em seu corpo habitava tamanha volúpia.

“Por isso essa força estranha…”

Esse retorno súbito da pulsão sexual, sem aviso prévio, é um dos motivos que leva o adolescente a se sentir inadequado, desconfortável, envergonhado e, por conta disso, a refugiar-se, muitas vezes, numa atitude de isolamento e timidez. Ao ser tomado de assalto por aquela estranha força que curiosamente advém de si mesmo e que traz consigo uma série de alterações no corpo (pêlos, menstruação, crescimento dos seios etc.) o adolescente se sente como se estivesse o tempo todo nu. Isso ocorre porque a pulsão se manifesta de modo tão intenso que começa a parecer ameaçadora, de modo que a imagem egóica que o sujeito havia constituído até então para si torna-se frágil. A sensação de nudez perene é uma das formas possíveis de elaboração pela via da fantasia da da insegurança gerada por tais alterações subjetivas.

Fantasmas de amor

No entanto, um número grande de adolescentes experimenta um retraimento muito mais severo em relação ao sexo oposto e isso está ligado não tanto à segunda irrupção ameaçadora da pulsão sexual, mas à primeira. Explico: no advento da pulsão sexual na infância, dissemos que a libido está bastante fixada na boca e no ânus, que são zonas do corpo ligadas à satisfação de necessidades fisiológicas do indivíduo.

No entanto, para que o pequeno infante pudesse se satisfazer sexualmente a partir dessas zonas, outras pessoas tiveram que se fazer presentes na vida do bebê. Que pessoas são essas? A mãe, o pai e/ou outros que estivessem cuidando do bebê na época. Uma dessas outras pessoas forneceu o seio ou algum substituto para a satisfação da necessidade de alimentação e, ao mesmo tempo, estimulou a mucosa da boca do bebê fazendo com que ele obtivesse um prazer a mais, um prazer que não era o da saciedade por ter sido alimentado, mas um prazer ligado propriamente à estimulação da mucosa da boca, um prazer, portanto, sexual. Embora esse prazer fosse essencialmente autoerótico, ele passou a estar irremediavelmente ligado à pessoa que forneceu o objeto para que ele fosse sentido. Lembrando que essa pessoa geralmente é a mãe. O mesmo ocorre com o prazer ligado à satisfação da necessidade de excreção. Conquanto esse prazer, para ser sentido, independa de outra pessoa, afinal a estimulação do ânus é feita pelas próprias fezes, o pequeno animal civilizado humano depende de alguém que limpe seu bumbum, o que faz com que o prazer de defecar passe também a estar ligado a uma pessoa. Lembrando que geralmente quem faz a higiene do bebê é a mãe ou o pai.

O que quero dizer com tudo isso? Que na infância a pulsão sexual está geralmente associada a pessoas bastante específicas: os pais! Nesses primeiros momentos, tradicionalmente chamados de fase oral e fase anal, o sexo dos pais não é relevante, pois o mais importante é o prazer localizado que o bebê sente. No entanto, por volta dos cinco anos, a criança começa a se fazer perguntas acerca da diferença entre homem e mulher e, concomitantemente, a se interessar sexualmente e ter fantasias com o genitor do sexo oposto, iniciando uma relação de rivalidade com o genitor do mesmo sexo. Trata-se do que Freud chamou de “complexo de Édipo”.

Curiosamente, nesse trágico momento, em que as fantasias sexuais em relação ao genitor do sexo oposto começam a se intensificar, a pulsão sexual resolve proclamar trégua e se inicia o período de latência! Como a sexualidade, durante toda a latência, estará num estado de calmaria, o sujeito inevitavelmente recalcará (esquecer-se-á deliberadamente) a paixão que nutria pelo genitor do sexo oposto. Em outras palavras, na latência, a menina não mais se lembrará do seu sonho de casar-se com o papai e tampouco o garoto se recordará dos sonhos que nutria de ocupar o lugar do papai na cama da mamãe.

Quando chega a adolescência e a pulsão sexual novamente se levanta, para-além de ser invadido por tamanha força libidinal, o jovem se vê às voltas com um terrível impasse: por um lado, a cultura lhe diz que ele deve se engajar num processo de busca por alguém que seja ao mesmo tempo do sexo oposto e de fora do seu círculo familiar. Por outro, a retomada da pulsão sexual traz consigo os antigos objetos de amor dos tempos de criança, ou seja, os pais e, especialmente, o genitor do sexo oposto. A diferença é que agora o jovem já está com a proibição do incesto inculcada na sua cabeça, de modo que em vez de experimentar o intenso desejo sexual que nutria pelo genitor do sexo oposto aos cinco anos de idade, ele sente nojo, vergonha, dor psíquica. Ao mesmo tempo, e para desespero do adolescente, como o seu referencial de objeto de amor é o genitor do sexo oposto, toda vez que ele olha para alguém que lhe desperta desejo sexual o que ele vê é o genitor do sexo oposto, ou seja, incesto!

É óbvio que tudo isso não acontece de modo consciente. Portanto, não tente perguntar a nenhuma adolescente se ela fica vendo a imagem do pai em todo garoto pelo qual se interessa. Ela provavelmente lhe dirá que isso é ridículo e que se sente apenas insegura e com medo de levar um fora, mas sequer suspeitará que, por trás dessas racionalizações, há uma fantasia de incesto que ainda roda com bastante força em seu inconsciente. Não obstante, a clínica com sujeitos adolescentes (e adultos) demonstra que essa inferência é plenamente justificada.

Tente, todavia, fazer um exercício mental. Tente se imaginar no inconsciente de um jovem de 13 anos que está apaixonado por uma colega de sala. Você verá que toda vez que ele se imagina ao lado da garota surpreende-se ao constatar que quem de fato está ao seu lado é sua mãe! Ora, não seria natural que esse adolescente não conseguisse sequer se aproximar da jovem?

Pois é exatamente isso o que acontece com inúmeros adolescentes. Sua timidez não é oriunda da situação atual em si, ou seja, ele não é tímido porque teme não conseguir conquistar a garota. Essa é uma modalidade já adulta de timidez. O adolescente não consegue sequer cortejar a garota por que ainda é assombrado pela imagem daquela que na infância fora a rainha de seus sonhos, a mãe. No inconsciente do jovem, a libido ainda está bastante aferrada ao objeto primitivo materno, de sorte que ainda demorará algum tempo até que ele possa contar com uma conta suficiente de libido para investir em outro objeto sexual. Alguns, sequer com a passagem do tempo, conseguem se desvencilhar do fantasma materno. Encontrá-los-emos, provavelmente, no divã.

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Esta obra, fruto de uma pesquisa de mestrado em Teoria Psicanalítica, pretende explorar o incremento do fenômeno das passagens ao ato entre os sujeitos adolescentes. Partimos de um breve estudo sobre a especificidade do trabalho psíquico demandado na adolescência, o qual serve de base para uma reflexão sobre a revivência da situação de desamparo. A partir dessa reflexão, tentamos mostrar como uma eventual convocação do corpo, sob a forma do ato, possui caráter de resposta extrema, à qual o ego pode apelar diante de uma vivência interna de transbordamento pulsional, aliada a um estado de fragilidade narcísica. Tais aspectos, de natureza metapsicológica e psicopatológica, são também articulados com peculiaridades do contexto em que vivem hoje os adolescentes ocidentais. Buscamos demonstrar o quanto a dimensão de desamparo, com toda sua complexidade, tem sido determinante no incremento do fenômeno das passagens ao ato na atualidade. A análise dessa questão é desenvolvida tendo como pano de fundo primordial o âmbito privado da família.