No último post vimos que a concepção winnicottiana de mente é revolucionária em muitos aspectos. O primeiro deles refere-se ao fato de que, se para a grande maioria dos psicólogos e filósofos, a mente é algo já dado, já presente na constituição inata do homem, para Winnicott a mente surge fundamentalmente como uma reação. Reação, em primeiro lugar, à mãe que não se comporta de acordo com os desejos da criança e, em última instância, ao acaso do mundo.
Uma segunda implicação dessa concepção é a de que eu posso fazer da mente tanto um instrumento de compreensão do mundo quanto uma defesa contra o mundo. Uma vez que a mãe falha e a mente emerge como uma função que dará asas à imaginação do bebê para buscar compreender por que a mãe falha, a mente então pode ser utilizada como o instrumento que possibilitará essa compreensão. Por outro lado, o sujeito pode fazer uso dessa mesma função para afogar-se em um mar de explicações, transformando aquilo que serviria para compreender, numa forma de intelectualização que só serve para que o sujeito se defensa de sua incapacidade de compreender.
Pois bem, senhoras e senhores, não é exatamente essa última alternativa a da Filosofia, da Teologia e da Psicologia tal como nós as conhecemos? Com seus conceitos afastados do mundo real, imersos nas categorias do metafísico e do metapsicologia, buscam uma compreensão do mundo, de Deus e do psiquismo que se perde numa imensidão de abstrações (Exceção feita a Nietzsche, Spinoza, os pragmáticos e alguns outros filósofos).
Os teólogos, principalmente, são os maiores representantes desse uso inadequado da mente (como intelectualização): por não compreenderem a vontade divina (mistérios insondáveis, já dizia a Bíblia), inserem Deus e tudo o que se relaciona a ele nas categorias da razão, esterilizando a Revelação.
Por mais que eu aprecie a teoria lacaniana da Psicanálise, também não posso deixar de incluí-la no conjunto daqueles que preferiam o conforto do mundo das idéias. Façamos justiça: a ética lacaniana, o tempo lógico, o estádio do espelho e o destaque dado à função do significante no psiquismo, foram contribuições extraordinárias de Jacques Lacan. Porém, a ênfase dada à topologia, à teoria dos nós e à matemática, são coisas absolutamente desnecessárias à Psicanálise. Só servem para fazer o campo analítico ficar parado no tempo, masturbando-se intelectualmente em torno das ilustrações lacanianas.
Na outra ponta do barbante, encontram-se aqueles nos quais a função da mente parece não ter surgido. Lembrem-se: a mente, para Winnicott, só surge porque o sujeito percebe que o mundo falhou. Então ele tem que parar para matutar sobre o mundo pra tentar entender porque ele falhou. Daí pode-se depreender a ausência de intelectualidade tão comum na contemporaneidade e que se exemplifica por aqueles que frequentam micaretas. A ilusão dada por esse tipo de evento e tudo o que a ele se associa, quer dizer, os comportamentos cotidianos bem como os “aquecimentos” e “ressacas” é a de que o sujeito pode tudo, que para beijar uma garota basta que ele a puxe pelo braço, que a vida é uma bebedeira e uma festa perene.
Um sujeito desses vai pensar? Pra quê?…
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Lucas,
Sou apreciador da teoria winnicottiana, até mesmo por ter conhecido alguns estudiosos da área (como os professores José Outeiral e Sandra Baccara).
Seria interessante tratar também da defesa de que o bebê lança mão quando a mãe falha além das possibilidades dele, o falso self.
Os estados psicológicos que se formam a partir daí e a função fundamental de continência do analista são aspectos muito importantes para entender o que é chamado hoje de Transtorno de Personalidade Anti-Social, um problema até mais que psicológico, social.
Percebo que Donald Winnicott está sendo descoberto em várias faculdades do Brasil. Em breve, terá um lugar de maior destaque no meio acadêmico.
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